Poéticas Urbanas foi contemplado como projeto especial apoiado pelo Fundo de Arte e Cultura da Sec. de Cultura do GDF e prevê: oficinas gratuitas de poesia falada nos bairros do Distrito Federal; publicação do livro Entreaberta composto por textos do blog de Patrícia Del Rey; e estudos de performances feitos pela companhia para transformar em imagens o universo existente nos textos da atriz , que em sua maioria falam da cidade Brasília e da figura feminina.

Este estudo foi ensaido nas quadras do Plano Piloto em busca de intimidade com o concreto, com as janelas e com os passantes. O trabalho ainda em processo, são poesias vertidas em pequenas cenas de transição em uma linguagem mista de teatro e performance.
Não contaremos uma estória, contaremos passos pelas ruas da cidade.

FICHA TÉCNICA:


Concepção: Andaime Cia de Teatro
Direção: Tatiana Bittar e Márcio Menezes
Intérpretes: Ana Luiza Bellacosta, Kamala Ramers, Larissa Mauro, Márcio Menezes, Patrícia Del Rey e Tatiana Bittar
Músicos: Lucas Ferrari e Marília Carvalho
Vídeo Projeção: Hieronimus do Vale

Luz: Zizi Antunes
Direção de Arte: Roustang Carrilho
Design Gráfico: Maíra Zannon Ilha Design
Fotos: Diego Bresani
Assessoria de Imprensa: Bruno Mendonça
Produção: Andaime Cia de Teatro e Tainá Lacerda

domingo, 1 de maio de 2011

Cimento Urbano

Toque: ato ou efeito de tocar; contacto; pancada; percussão; som; ato de tocar instrumentos; som que determina a execução de operações ou manobras militares; sabor ou cheiro especial de certos vinhos; vestígio; inspiração; esmero num trabalho artístico; aperto de mão como cumprimento; mancha que constitui indício de apodrecimento na fruta.

É triste. O tempo escoou esse substantivo masculino. Não sei se saiu de moda ou se foi deletado sem querer. O certo é que cada vez mais estamos imbuídos em uma solidão eterna. Nós vivemos no mundo embalado a vácuo. Eu não sei tocar, não sei ser tocada. Parece estranho olhando de fora. Porém é mais normal do que se imagina. Enquanto a visão sobra no mercado, o tato desapareceu das prateleiras. Talvez seja culpa do medo em excesso. Da falta de tempo. De apresso. Toque. Rasgos. Mãos. O contato é sempre contagioso e há muitas peles doentes.

Há algum tempo, olhando pelo espelho, descobri uma mancha cinza no meio das minhas costas. Era o começo dessa tal praga. De forma rápida, a mancha se espalhou pelo corpo e a pele ficou assim: coberta de cimento urbano. E não há chuva que consiga penetrar o concreto. A cara feia, o bico mimado. Somos cobertos de um egoísmo medroso que envergonha própria espécie.

Fechada - mesmo com a fachada aberta – nós trancamos em ilusões momentâneas. E como se os toques não passassem de pequenos espasmos em corpos efêmeros e desconhecidos. Sozinhos, seguimos nos nossos carros poluentes pelas ruas largas da cidade planejada.

Será que esse era o plano? Uma cidade rodeada de monumentos brancos, o tempo seco e espaço. Muito espaço. Brasília expande o espaço entre os corpos. É preciso sair, é preciso dançar, é preciso chegar perto. Ou você se força a reagir ou amplitude te afoga. Temos que martelar o concreto. Se livrar dessa epidemia contemporânea e tocar.  

Som das palavras soltas. Saborear o gosto de uma erva dividida. Cheirar a visita efêmera da chuva. E principalmente dialogar com as mãos. Cuidar para que elas não esmaguem. Para que elas não deixem escorrer. Arrancar a casca. A minha, a sua, a vossa. E se atirar de novo. Outra vez. E mais uma vez. E outra. E ter coragem. Ser Vinicius. Aceitar o vício. E abrir as pernas. E gritar de vez em quando.

Essa é a minha tentativa poética de medicamento. Temos que agir rápido porque a doença está se alastrando. É preciso colorir essas peles acinzentadas. Eu ainda não sei remover a minha mancha. Nem dissolver o concreto. Mas acredito no poder das minhas mãos. E das suas também. 

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